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Justiça manda Carrefour punir funcionários acusados de racismo

 A Justiça determinou que mercados da rede Carrefour passem a punir funcionários que pratiquem atos racismo dentro das lojas da franquia. A decisão foi assinada pelo juiz substituto da 39ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, José Dantas Diniz Neto. 



Diniz Neto se manifestou em um processo que envolve denúncias de racismo no supermercado Atacadão, localizado em Santa Cruz, na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro. Mas vem à tona menos de um mês depois que um homem negro ter sido espancado até a morte por seguranças do Carrefour em um supermercado de Porto Alegre. Laudos médicos apontaram que , de 40 anos, morreu por asfixia. As cenas do espancamento foram registradas por câmeras de segurança e viralizaram na internet, provocando uma onda de protestos pelo país em meados de novembro. 

As sanções proferidas pelo juiz nesta decisão têm abrangência nacional, ou seja, devem ser aplicadas em todas os supermercados da rede Carrefour. 

O processo é um desdobramento de uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho do Rio com base em denúncias de empregados, vítimas de racismo nas dependências do Atacadão. Uma delas é uma ex-auxiliar de cozinha que disse que um colega costumava escrever no avental a frase "só branco usa". 

Em seu depoimento ao Ministério Público, a mulher afirma que também ouvia expressões do tipo: "jamais casaria com uma preta", "ainda bem que você é branca, pois, se fosse negra, não ia gostar", ou ainda "preto só etra na igreja para chamar branco de irmão". 

Para Diniz Neto, os depoimentos contidos nos autos do processo indicam que a empresa era conivente com esses episódios. "Deflui dos depoimentos acima transcritos que, como narrado na peça vestibular,a chefia eo setor dos recursos humanos tinham absoluta ciência das práticas discriminatórias efetivadas contra os empregados no referido local de trabalho", escreveu o magistrado. 

E mais, considerado o período de prestação de serviços dos depoentes, não estamos diante de caso isolado, uma vez que as práticas perduraram no tempo e sob o beneplácito da chefia - conivente com a prática dos crimes". 

Ao argumentar sobre a aplicação da decisão para todas as lojas do Carrefour no Brasil, o juiz listou uma série de links de reportagens sobre episódios de racismo associados à franquia - uma delas, sobre o assassinato de João Alberto Silveira Freitas. No que tange à abrangência territorial das ilegalidades, não apenas os prestadores de serviços do Município do Rio de Janeiro foram atingidos pelo descaso gerencial da empresa", sustentou. 

Dentre as determinações, a Justiça mandou que o Carrefour passe a aplicar sanções disciplinares efetivas a empregados que pratique qualquer forma de discriminação, além de estabelecer prazo de 90 dias para que o grupo crise meios de apuração de denúncas sobre racismo por parte de funcionários. A empresa terá também 90 dias para instaurar políticas efetivas de combate à discriminação em todas as lojas da rede, bem como também o de realizar campanhas de conscientização. 

Em caso de descumprimento, a Justiça definiu que o Carrefour terá de pagar R$ 100 mil por cada determinação não seguida, mais R$ 50 mil por cada trabalhador vitimado.



 
 
Poder JudiciárioJustiça do TrabalhoTribunal Regional do Trabalho da 1ª Região
 
 Ação Civiblica Cível0100698-44.2020.5.01.0039
 
Processo Judicial Eletrônico
 
Data da Autuação:
26/08/2020
Valor da causa:
$50,000,000.00
Partes:
 
RECLAMANTE:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO
RECLAMADO:
ATACADAO S.A.ADVOGADO: ALEXANDRE LAURIA DUTRAPAGINA_CAPA_PROCESSO_PJEADVOGADO: ANDREA MENDONÇA DEALBUQUERQUE PEREZ
 
 Assinado eletronicamente por: JOSE DANTAS DINIZ NETO - Juntado em: 01/12/2020 10:26:32 - 8e2b9be
 
PODER JUDICIÁRIOJUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1ª REGIÃO39ª Vara do Trabalho do Rio de JaneiroACPCiv 0100698-44.2020.5.01.0039RECLAMANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHORECLAMADO: ATACADAO S.A.Vistos.Trata-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho emface do ATACADAO S.A.
 –
 GRUPO CARREFOUR BRASIL, por meio da qual noticia a ocorrênciade práticas discriminatórias em estabelecimentos comerciais do réu, referentes à intolerânciareligiosa e racismo. Reclama a concessão de tutela de urgência.Em face do requerimento de antecipação dos efeitos da tutela de mérito, impõe-se a apreciação das preliminares suscitadas na contestação.
Inépcia da petição inicial
 Preliminar rejeitada na decisão de ID. bab1143.
Interesse de agir 
 Argui o réu a falta de interesse de agir, ao argumento de que os documentosanexados ao processo e os depoimentos colhidos no Inquérito Civil Público refutam por completoas alegações de fato e de direito que amparam os pedidos.Porém, o interesse de agir nasce da necessidade do ajuizamento da ação para asatisfação da pretensão autoral, que desponta no caso concreto pela negativa da defesa quanto àacusação de existência de racismo estrutural, no ambiente organizacional do réu.Ademais, a conclusão pela impertinência dos pedidos, a partir da análise doacervo probatório, é questão pertinente ao mérito da demanda e não autoriza a extinção prematurado processo. Rejeito a preliminar.
Ilegitimidade ativa
 Em síntese, sustenta o réu que inexiste legitimidade ativa do Ministério Públicodo Trabalho para o ajuizamento da presente Ação Civil Pública, em razão de a controvérsia dosautos envolver direitos individuais e heterogêneos, sobretudo quanto ao pleito de readmissão daSra. __________________.
 
 Assinado eletronicamente por: JOSE DANTAS DINIZ NETO - Juntado em: 01/12/2020 10:26:32 - 8e2b9be
 Do art. 83, III, da LC 75/93, extrai-se o entendimento de que, quando houverdesrespeito aos direitos sociais garantidos constitucionalmente, o Ministério Público do Trabalhoestará legitimado para propor a Ação Civil Pública.Tem, portanto, legitimidade para postular em juízo a tutela de interessescoletivos atuando em nome da coletividade (art. 129, III da CF),
lato sensu,
em socorro de grupoou categoria de trabalhadores (art. 81, § único, II, do CDC), bem como na defesa de interesses
individuais homogêneos, porquanto a expressão “difusos e coletivos”, presente no
textoconstitucional, deve ser interpretada em sentido amplo, abarcando todas as formas de interessescoletivos, incluindo-se neste rol os individuais homogêneos e os subjetivos específicos (arts. 81, 82e 90 do CDC, art. 6º, VII,
d
, e XII, da LC 75/93, e art. 25, IV,
a
, da Lei 8.625/93).Nesse sentido a jurisprudência do C.TST,
in verbis
:
“ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM –
 SINDICATO
 –
 
SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL
 –
 
DEFESA DE DIREITOS
 
INDIVIDUAIS HETEROGÊNEOS.
Esta Corte, por meio de sua SBDI1,tem afirmado que o Sindicato possui ampla legitimidade para pleitear,em juízo, todos e quaisquer direitos dos integrantes da categoria querepresenta. Com ressalva de entendimento pessoal. Recurso de
revista conhecido e provido.”(RR 
-3091-15.2011.5.02.0008)
 Ademais, justifica-se a atuação do Órgão Ministerial pela repercussão erelevância social da matéria discutida no processo, que autorizam o manejo da Ação Civil Pública,na forma da Lei 7.347/85 e do Código de Defesa do Consumidor.Afasto a preliminar.
Impossibilidade jurídica do pedido
 O ordenamento jurídico pátrio não mais reconhece a impossibilidade jurídica dopedido como condição de ação. Inclusive, o art. 140 do CPC determina que o magistrado decidamesmo diante da alegação de lacuna ou obscuridade da lei. Assim, a mencionada falta de amparolegal para o pedido de readmissão da Sra. _________ é questão relativa ao mérito, a ser analisadaoportunamente. Rejeito.
Cumulação de pedidos
 Defende o réu que o art. 3º da Lei nº 7.347/85 não admite a cumulação dopedido de condenação em dinheiro e de cumprimento de obrigação de fazer, uma vez que utilizou
a conjunção alternativa “ou”, quando definiu o que pode ser objeto da Ação Civil Pública.
 No particular, enalteço a jurisprudência da Corte Superior Trabalhista, acerca damatéria:
 
 Assinado eletronicamente por: JOSE DANTAS DINIZ NETO - Juntado em: 01/12/2020 10:26:32 - 8e2b9be
 
“RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI
11.496/2007. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ARTIGO 3º DA LEI Nº 7347/85.
 
OBRIGAÇÃO DE FAZER E CONDENAÇÃO EM PECÚNIA.CUMULAÇÃO DE PEDIDOS. TUTELA INIBITÓRIA E DANOEXTRAPATRIMONIAL COLETIVO. Cinge-se a controvérsia a sedefinir se o artigo 3º da Lei da Ação Civil Pública, ao prever apossibilidade de condenação em obrigação de fazer oucondenaçãoem dinheiro, o faz de maneira cumulativa ou excludente.Diferentemente do entendimento adotado pela Douta Turma, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho vem se inclinando nosentido de admitir que são pedidos cumulativos. Com efeito, a multapor obrigação de fazer tem por objetivo o cumprimento da obrigaçãoprevista na Lei, enquanto que a indenização por dano extrapatrimonialcoletivo tem por finalidade a compensação do período em que acoletividade foi privada do cumprimento da Lei. Trata-se de lesão quenão deve deixar de ser reparada na medida em que o descumprimentoda lei gerou efeitos deletérios, que se prolongaram no tempo.Precedente: Processo nº TST-E-ED-RR- 11560015.2004.5.03.0004,Redator Ministro: Lelio Bentes Corrêa, Data de Julgamento:10/6/2010, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Datade Publicação: DEJT 9/3/2012). (TST-EED-RR133900-83.2004.5.02.0026, Subseção I Especializada em DissídiosIndividuais, Relator Alexandre Agra Belmonte, Data de Publicação:
DEJT 22/05/2015)” 
 Do exposto, a interpretação da norma que melhor favorece o alcance da sua
finalidade, e atende a intenção do legislador, é a de que a expressão “ou” autoriza a cumulação dos
pedidos.Afasta-se a preliminar.
Mérito
 Relata a exordial que o Ministério Público do Trabalho instaurou o Inquérito CivilPúblico de nº 006284.2020.01.000/2, a partir da Notícia de Fato nº 006284.2020.01.000/2, autuadaem decorrência de denúncia encaminhada ao Disque 100 da Ouvidoria de Recursos Humanos.Em apertada síntese, informa que, após a apuração dos fatos denunciados,comprovou-se a ocorrência de práticas discriminatórias contra empregados no ambiente corporativodo réu, concernentes à intolerância religiosa e racismo, e que foram ignoradas pelas chefias.A defesa, por sua vez, assevera que a empresa é comprometida com os mais
 
 Assinado eletronicamente por: JOSE DANTAS DINIZ NETO - Juntado em: 01/12/2020 10:26:32 - 8e2b9be
 elevados padrões éticos de conduta e possui política permanente de combate à discriminação,efetivada por meio de palestras e treinamentos ministrados aos empregados, com base no seuCódigo de Ética e Política de Diversidade.Argumenta que existe canal confidencial de denúncias, disponível aosempregados, para comunicação de qualquer violação de direito, denominado
Disk Ética
, e quesindicâncias administrativas são regularmente instauradas para apuração dos fatos denunciados.No que tange ao caso da Sra. ______, pondera o réu que os fatos não foramrepassados através do referido instrumento de denúncia, de modo que tomou ciência do ocorridoapós o início da investigação pelo D.
Parquet
, quando então instaurou a competente sindicânciade apuração, que culminou com a aplicação da penalidade máxima ao agente.Por fim, refere que a situação discutida nos autos corresponde a um casoisolado, em relação ao qual foram adotadas medidas enérgicas. Refuta, com veemência, a tese deexistência de racismo estrutural na empresa.Ao exame.Inicialmente, cumpre ressaltar que o réu alega desconhecimento dos fatosdenunciados até ser notificado para participação da audiência virtual do Inquérito Civil Público (ID.62d6021 - Pág. 18). No entanto, os depoimentos colhidos na sindicância realizada pela empresacomprovam o contrário (ID. 63b2f5c). Vejamos:
Perguntado se existe brincadeira no setor, respondeu que sim, muitase algumas até desagradáveis. Perguntado qual foi a que presenciouque foi desagradável, respondeu que no primeiro dia de trabalho o _____ falou no tom de brincadeira: Ah!
 Aindbem quvocê ébranca, pois se fosse negra não ia gostar 
....
 
Perguntada se presenciou alguma
“brincadeira” envolvendo religião,
respondeu que sim, informou que o
 ______ pegava um balde eficava tipo batendo tambor 
” (...) Perguntado se com essa atitude
ficava declarado preconceito com alguém, respondeu que sim comcerteza.
 
Perguntado com quem, respondeu com a _____, acrescentou queeles faziam essas brincadeiras desagradáveis. (...) Perguntado setodas essas situações eram de ciência da nutricionista e do RH,respondeu que
por duas vezes a nutricionista chamou eles praconversar 
. (
Sra. _________; ID. 4b73a05 - Pág. 8
 )” 
 
 
 Assinado eletronicamente por: JOSE DANTAS DINIZ NETO - Juntado em: 01/12/2020 10:26:32 - 8e2b9be
 
Perguntado se já presenciou alguma brincadeira no setor queenvolvesse preconceito com
religião, respondeu que fazempiadas...
 
 Algumas vezes, a gente brincava também com a _____, pois ela eraespírita e a gente batia na mesa, como se fosse um tambor... o _____sempre brinca comigo, e ela achava que as brincadeiras eram paraela e não era, ele estava brincando comigo, como por exemplo,
ele
sempre escreveu um avental: “Só branco usa”....
 
Perguntado o porquê ele escreveu isso no avental, informou que elesempre brincava assim, pois todos precisam renovar constantementeseu avental porque fica desgastado rápido e ele sempre marcava oavental dele com essa brincadeira Perguntado de religião, sorriunovamente e disse que a última piada foi:
o preto só vai para a igrejapara chamar o branco de irmão
.(...)
 
Perguntado se ele escrevia isso no avental mesmo antes da _____fazer parte da empresa, respondeu que sim, ele sempre fez essabrincadeira e eu nunca fiquei chateado Perguntado se ele escreviaisso no avental mesmo antes da _____ fazer parte da empresa,respondeu que sim, ele sempre fez essa brincadeira e eu nunca fiqueichateado. mas quando ela entrou na empresa e viu, achou que erapra ela, mas ele sempre fez isso.
 
Perguntado se quando ela ficou chateada,
foi falar no RH daempresa, respondeu que sim, que ela chamou a _____(nutricionista) e foram as duas para o RH.
(
 ______; ID. 4b73a05 -Pág.5
 )” 
 
em sequência lembrou que presenciou sim mais uma situaçãodemonstrando preconceito e disse que ouviu de uma pessoa dizendoque não se via casado com uma preta, acrescentou o que issopresenciou, foi perguntado se poderia falar de quem ouviu essaexpressão, foi respondido que do ______.
(
Sr. _____; ID. 433b908 -Pág. 2
)”,
 Deflui dos depoimentos acima transcritos que, como narrado na peça vestibular,a chefia e o setor dos
Recursos Humanos
 tinham absoluta ciência das práticas discriminatóriasefetivadas contra os empregados do réu, no referido local de trabalho. Como exemplo, podemoscitar que o Sr. ________
continuamente escrevia no avental a expressão “
só branco usar
” e
proferia
falas como a que “
 jamais casaria com uma preta
”, “
ainda bem que você é branca, poisse fosse negra não ia gostar 
ou que “
preto só entra na igreja para chamar branco de irmão
”.
 
 Assinado eletronicamente por: JOSE DANTAS DINIZ NETO - Juntado em: 01/12/2020 10:26:32 - 8e2b9be
 Alguns empregados também batiam panelas para simular o som de tambores, a fim de menosprezaros adeptos das religiões de matriz africana.Desta feita, restou comprovado que havia prática reiterada de condutas racistase de intolerância religiosa, com violação dos direitos individuais dos trabalhadores que prestavamserviços no setor, sem que a chefia adotasse qualquer medida punitiva contra os agentes, capazde restabelecer a higidez do ambiente de trabalho e inibir a reiteração das condutas.Inclusive, o réu apresentou as penalidades aplicadas aos funcionários, noperíodo, e podemos constatar que em nada se relacionaram com a matéria discutida nos autos, oque corrobora a tese de que os atos discriminatórios foram subestimados pela chefia econsiderados como brincadeiras de mau gosto, à época que ocorreram (ID. eb58be7).E mais, considerado o período de prestação de serviços dos depoentes, nãoestamos diante de caso isolado, uma vez que as práticas perduraram no tempo e sob o beneplácitoda chefia - conivente com a prática dos crimes. Outrossim, os relatos comprovam que o Sr. ______não era o único agressor, tampouco a Sra. _____ a única vítima das ofensas.Ora, o ambiente laboral deve ser um espaço que promove o bem estar físico epsíquico do trabalhador, potencializa suas aptidões profissionais e agrega valores positivos à suavida. Assim, o contrato de trabalho não lhe retira a condição de titular de direitos fundamentais,voltados à proteção de sua dignidade, sendo, portanto, inaceitável a admissão de práticasdiscriminatórias por parte da empresa.Inclusive, o empregador detém o dever de fiscalização da prestação de serviçose responde objetivamente pelos danos extrapatrimoniais suportados pelos empregados, no local detrabalho (art. 932 do Código Civil).É oportuno ressaltar que a empresa trouxe à colação o seu Código de CondutaÉtica, onde estão arrolados os princípios norteadores da prestação de serviços dos empregados,dentre eles a proteção da diversidade, a contribuição para um ambiente de trabalho saudável e arecusa à discriminação (ID. 987c264 - Pág. 1). Igualmente, há prova nos autos de que ostrabalhadores são cientificados do seu conteúdo, por ocasião da admissão, e que participam detreinamentos periódicos com temas relacionados à discriminação, no curso do contrato de trabalho.Entrementes, o teor dos depoimentos comprova a completa inefetividade dasmedidas de conscientização executadas pelo réu, como consequência da ausência de fiscalização,por parte dos gestores, quanto ao cumprimento das diretrizes fixadas no referido regulamento.Logo, a política educativa instituída pela empresa merece ter o seu escopo ampliado, de modo aestabelecer uma cultura corporativa que expurgue, em definitivo, as práticas nocivas acimaapontadas.Lembremo-nos que as liberdades econômicas e de livre iniciativa foram elevadasao patamar de fundamento do Estado Democrático de Direito, mas o exercício da atividadeempresarial deve obediência a outros princípios de mesma hierarquia, a exemplo do respeito àdignidade da pessoa humana e ao valor social do trabalho (art. 1º, III e IV, da Constituição Federal).
 
 Assinado eletronicamente por: JOSE DANTAS DINIZ NETO - Juntado em: 01/12/2020 10:26:32 - 8e2b9be
 Além disso, a valorização do trabalho humano constitui fundamento da ordem econômica nacional(art. 170).Quanto ao racismo, a
Lei Maior
não apenas protegeu as pessoas negras contraatos discriminatórios, ao tipificar a sua prática como crime inafiançável e imprescritível (art. 5º, XLII),como também estabeleceu que o repúdio ao racismo é um princípio que rege a RepúblicaFederativa Brasil, em suas relações internacionais (art. 4º, VIII). No mesmo sentido ventila aproteção constitucional dirigida à liberdade de crença religiosa e à não discriminação por fatoresinjustos e desqualificantes (art. 5º,
caput
e inciso VI).Na seara infraconstitucional, podemos citar diversas normas que se prestam àerradicação da prática de racismo, inclusive no ambiente de trabalho, a exemplo do art. 140, §3º,do Código Penal, do art. 38 da Lei nº 12.288/20 e do art. 4º, §1º, III, da Lei nº 7.716/89.Conforme se infere do arcabouço normativo acima delineado, a permissãoestatal para o desenvolvimento de atividade econômica impõe aos detentores dos meios deprodução a assunção de compromissos atinentes à proteção dos direitos fundamentais dosindivíduos, porquanto asseguradores do desejado avanço civilizatório da sociedade. A propriedadeatenderá a sua função social (art. 5º, XXIII, da CRFB).
In casu
, não restam dúvidas de que foram violados preceitos de hierarquiasuperior do ordenamento jurídico, alusivos à tutela da honra e dignidade dos trabalhadores,porquanto emerge da realidade material, comprovada nos autos, que o réu não promove afiscalização voltada à preservação da higidez mental dos seus empregados, expondo-os a práticasde discriminação odiosa, consubstanciadas em racismo e intolerância religiosa.É imperioso salientar, ainda, que o Sr. ______ ousadamente assinava o seu
nome embaixo da expressão “só pra branco usar”, no avental, e não sofreu penalidade por essa e
outras ofensas de idêntica natureza, relatadas nos depoimentos (ID. a3d511e - Pág. 1). A meradeterminação para que ele apagasse a frase revela o quanto a empresa, através de suas chefias,subestima as práticas discriminatórias presentes no cotidiano de trabalho dos empregados.Lado outro, a Senhora ______ fora advertida por não realizar o correto registro dohorário de saída para o intervalo intraturno, no sistema de controle de ponto.Tais circunstâncias revelam a completa inversão de valores que orienta a políticade recursos humanos da empresa, a qual mantém impunes empregados que praticam atos dediscriminação, tipificados como crime, e penaliza outros por condutas notadamente menos graves(ID. eb58be7 - Pág. 1).Não menos importante é a declaração de uma das vítimas, que afirma não sesentir ofendida por agressões desse gênero. A assertiva apenas lança luz sobre um dado sensívelda realidade e explicita o quanto a ideia de subalternidade entre as raças encontra-se imbricada notecido social, ao ponto de os próprios vitimados não reconhecerem as hostilidades a que estãosubmetidos no seu dia a dia. É o racismo estrutural.
 
 Assinado eletronicamente por: JOSE DANTAS DINIZ NETO - Juntado em: 01/12/2020 10:26:32 - 8e2b9be
 Frise-se que declarações anexadas sob o ID 29a7759 - Pág. 1 não alteram opanorama exposto, eis que não se sobrepõem ao quadro fático robustamente comprovado nosautos e desfavorável ao réu.No que tange à abrangência territorial das ilegalidades, não apenas osprestadores de serviços do Município do Rio de Janeiro foram atingidos pelo descaso gerencial daempresa. Passo a transcrever
links
de notícias que comprovam a ocorrência de agressões contratrabalhadores negros, em diferentes regiões do Brasil:https://www.metropoles.com/brasil/funcionario-do-carrefour-morre-eloja-esconde-corpo-com-guarda-soishttps://www.anf.org.br/carrefour-causa-indignacao-por-morte-deempregado-durante-o-expediente/https://brasil.elpais.com/brasil/2020-08-19/a-banalidade-da-morte-asombra-dos-guarda-sois.htmlhttps://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2020/11/22/videomostra-cliente-do-carrefour-imobilizado-no-chao.htmhttps://www.brasildefato.com.br/2020/11/21/racismo-e-morte-nocarrefour-sao-a-ponta-de-um-iceberg-envolvendo-multinacionaishttps://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2020/11/24/policiaprende-mais-um-envolvido-na-morte-de- joao-alberto.ghtmlInobstante os fatos extraídos das notícias, acima lançadas, escapem ao objetoda investigação que deflagrou o ajuizamento da presente ação coletiva, é certo que dialogam comos fundamentos jurídicos que alicerçam a pretensão autoral. Ademais, por serem públicos enotórios, não há óbice para que integrem a presente fundamentação (art. 374 do CPC).Reporto-me, por fim, às inúmeras notícias veiculadas na mídia, arroladas naexordial e na petição de ID. a29c031, que comprovam a magnitude das lesões denunciadas peloD.
Parquet
 e a dimensão suprarregional do dano.Ante o explicitado, estou convencido de que o racismo e a prática de intolerânciaàs religiões de matriz africana avançam no ambiente corporativo da empresa, em todo o país, oque expõe a absoluta ineficácia do seu instrumento interno de comunicação de denúncias e afalência do aludido programa de ética e integridade.E se vidas foram ceifadas, simbólica e materialmente, não há o que esperar.Presentes os pressupostos legais insertos no art. 311 do CPC, defiro, em parte,
 
 Assinado eletronicamente por: JOSE DANTAS DINIZ NETO - Juntado em: 01/12/2020 10:26:32 - 8e2b9be
 a tutela de urgência requestada para determinar, ao réu, o cumprimento das seguintes obrigações:a) Imediatamente, abster-se de adotar ou tolerar qualquer 
 
condutaque possa ser caracterizada como prática discriminatória contratrabalhadores, em razão da religião, raça, cor, cultura ou etnia,garantindo-lhes tratamento digno no ambiente laboral.b) Imediatamente, passe aplicar sanções disciplinares efetivas aempregados que pratiquem qualquer forma de discriminação contraseus colegas, em razão da religião, raça, cor, cultura ou etnia.c) No prazo de noventa dias, estabeleça meio efetivo pararecebimento e apuração de denúncias específicas sobre racismo porparte dos seus empregados, garantindo-lhes o sigilo da identidade dodenunciante, nos termos do art. 10 do Decreto nº 9.571/2018;d) No prazo de noventa dias
,
instaure efetiva política de combate àdiscriminação em suas dependências, devendo realizar campanhapermanente de conscientização de seus empregados, diretores eprestadores de serviços terceirizados, a qual deverá contar, no mínimo,com palestras, cartazes e mensagens eletrônicas, proporcionandoefetivo letramento racial no ambiente de trabalho.
 
 O descumprimento das obrigações acima importará no pagamento de multa novalor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por cada obrigação descumprida, acrescida de R$50.000,00 (cinquenta mil reais) por cada trabalhador vitimado.Com esteio no art. 103 da Lei nº 8.078/90, e por estarmos diante de danosuprarregional, decido que a presente decisão produzirá efeitos
ergaomnes
e em todo territórionacional.Noutro giro, em sede de cognição sumária, não vislumbro os elementos deprobabilidade do direito para aos demais pleitos. Rejeito-os.Intimem-se as partes.RIO DE JANEIRO/RJ, 01 de dezembro de 2020.JOSE DANTAS DINIZ NETOJuiz do Trabalho Substituto
 
 
Assinado eletronicamente por: JOSE DANTAS DINIZ NETO - Juntado em: 01/12/2020 10:26:32 - 8e2b9behttps://pje.trt1.jus.br/pjekz/validacao/20120109361407300000123242257?instancia=1
 
Número do processo: 0100698-44.2020.5.01.0039
 
Número do documento: 20120109361407300000123242257
 
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